«Gralhas»
Uma ideia agregadora

O novo livro de poesia de Eduardo Jorge Duarte tem uma ideia agregadora, semelhante à ideia de clima. Em «Gralhas» há uma sucessão habitual de estados do tempo ao longo de um período significativo, em que cada poema surge como surgem as condições meteorológicas de cada dia.

Texto: Redação «human»

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Os poemas do livro «Gralhas» (ed. On y va), heterogéneos e diversos, têm uma ideia agregadora, semelhante à ideia de clima: uma sucessão habitual de estados do tempo ao longo de um período significativo, em que cada poema surge como surgem as condições meteorológicas de cada dia, com temperatura, precipitação, humidade, pressão atmosférica, vento, etc. Como no clima, estes poemas de Eduardo Jorge Duarte traduzem-se, portanto, pelo conjunto de todos os estados que a sua atmosfera humana pode conhecer em dias distintos, enquanto procura situar-se no mundo e situar o outro em si mesmo.

Escritos em alturas bem diferentes, os poemas são vistos pelo autor como algo cuja revisitação pode funcionar como aquelas músicas que perduram pelo tempo fora. Ele próprio nos diz: «Ao ouvi-las, quase conseguimos estar de novo no lugar onde as ouvimos pela primeira vez ou regressar aos ambientes e àqueles que nos rodeavam quando elas estavam nos tops. Por exemplo: alguns dos poemas foram escritos durante o primeiro confinamento ditado pela pandemia. Ao relê-los, quase consigo ouvir o ritmo limpo que havia nos trinados dos pássaros que pousavam na varanda de casa.»

Como qualquer outra manifestação criativa, estes poemas traduzem a visão do mundo do autor: «Um náufrago que se vê a sós com as suas leituras numa ilha e lança poemas engarrafados ao mar, à espera de que do outro lado do planeta haja alguém à procura do mesmo – empatia, alteridade e solidariedade», diz-nos. «Ou, se quisermos ser ainda mais metafóricos, são simples reflexões sobre os panoramas que se alcançam de um mundo que é afinal uma rua, serras emotivas onde o registo escrito funciona como as migalhas deitadas ao chão por Hänsel e Gretel [as crianças perdidas na floresta num dos contos recolhidos pelos irmãos Grimm], na esperança de que a curiosidade do leitor possa comer essas migalhas e levar-nos não de volta à casa de partida, mas ao outro, o único ponto de chegada pelo qual vale a pena criar.»

Para Eduardo Jorge Duarte, estes poemas são também a sua geodesia de perplexidades, sons, ritmos, mistérios… «Ligam-se à minha vida na medida em que, para além de procurarem responder às minhas leituras, têm ainda a intenção de, com novas perguntas, dar resposta à questão de quem somos e o que andamos a fazer à nossa vida, juntando-lhe a dimensão espacial, esta intimamente ligada à minha profissão de geógrafo». Ou seja, «o onde é essencial para que a triangulação alegórica da dúvida, da incerteza e da curiosidade possa criar um território feito de versos».

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Dois textos aqui e aqui.