Erros e enviesamentos

Todos nós, enquanto seres humanos, estamos condicionados a tomar decisões utilizando enviesamentos que funcionam como shortcuts para automatizar o comportamento, permitindo-nos ser céleres e poupar energia. Estes mecanismos têm, contudo, alguns revezes, dado que prejudicam a tomada de decisão lógica e racional, não emocional e que maximize proveitos.

Texto: Susana Almeida Lopes

 

A pandemia põe-nos à prova na nossa humanidade, na nossa capacidade de contrariar os nossos erros e enviesamentos, que são muitos. Destaco alguns, que deixo para reflexão.

Desde logo, o efeito de tomarmos decisões com base na informação que temos acessível no momento. A massificação de informação sobre a pandemia nos media faz com que a saliência dos números atinja proporções maiores do que são, de facto. E que julguemos, por exemplo, uma probabilidade de contágio muito maior do que efetivamente é. Não retiro daqui a gravidade da situação, apenas a proporção. Continuam a morrer mais pessoas diariamente por outras causas, mas não são notícia, e podemos, assim, desvalorizar a probabilidade de padecer de outros males.

Outro enviesamento é o de avaliarmos as situações de acordo com as nossas referências. Para quem está contagiado ou vive de perto situações de doença ou mesmo de fatalidade, esta doença é muito mais grave do que para quem se mantém a salvo. Tal terá efeitos nos tipos de comportamento que adotam em termos das regras de isolamento social, por exemplo.

Enviesamento interessante para este contexto é o da existência de um gap entre a nossa intenção e o nosso comportamento. Até colocamos no Facebook uma notificação «eu fico em casa» e podemos ter a melhor das intenções, mas depois torna-se diariamente imperioso sair, e há sempre uma boa razão.

Também a nossa tendência para procurar evidências confirmatórias das nossas opiniões tem destaque na situação atual. Talvez por aqui se explique as diferenças de perspetivas entre quem considera estarmos perante uma situação alarmante, acentuando o número exponencial de contágios e mortes; e quem considera que as medidas de isolamento são excessivas tendo em conta a baixa percentagem na população geral: cada um vê os números que quer ver e desvaloriza os que infirmam as suas convicções.

Mas há um mecanismo que gostava de destacar. Contrariamente ao que nos diz a teoria da racionalidade clássica, não agimos sempre para maximizarmos os proveitos próprios. E tal está refletido na cadeia de apoio social a que temos assistido. Os seres humanos são capazes das melhores ações em prol dos outros. Os profissionais de saúde estão na linha da frente, deixando para «depois» o cuidado da própria família. Várias organizações passaram a produzir os produtos necessários no combate à pandemia. Há informação jurídica disponível, webinares de formação gratuitos, avaliações on-line. Há toda uma abordagem de responsabilidade social ímpar que nos conforta.

Vale a pena termos enviesamentos e sermos humanos.

 

»»»» Susana Almeida Lopes é managing partner da SHL Portugal

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