Durante décadas, recrutámos a olhar pelo espelho retrovisor. Currículos impecáveis, títulos sonantes, resultados entregues; e a crença quase religiosa de que «quem fez bem uma vez, fará bem novamente». Mas, e se isso já não for verdade?
Texto: Pedro Branco Foto: DR
Vivemos num tempo em que o sucesso envelhece depressa. O que alguém fez há 10 anos – ou há três – diz cada vez menos sobre o que será capaz de fazer amanhã. As empresas deixaram de operar em terrenos estáveis. São ecossistemas mutáveis, tecnológicos, híbridos e imprevisíveis.
E, nesse contexto, o que realmente distingue as pessoas já não é o histórico; é a velocidade com que aprendem e se adaptam. Voltamos a Darwin, com um toque de ironia corporativa: não sobrevive o mais forte, mas o que melhor se adapta à mudança de paradigma.
O «Future of Jobs Report 2025», do World Economic Forum, é claro: 39% dos empregadores esperam que as competências essenciais mudem até 2030. E 85% das empresas estão a investir em upskilling. As palavras-chave? Criatividade. Resiliência. Adaptabilidade. Aprendizagem contínua.
E o relatório «Generation – EIT Deep Tech Talent Initiative» (2024) confirma o que muitos ainda resistem em aceitar: contratar com base em competências – e não apenas em históricos académicos ou experiências passadas – amplia o acesso a talento e fortalece os pipelines do futuro.
Em suma, a pergunta mudou. Deixou de ser «O que esta pessoa fez?» e passou a ser «O que esta pessoa é capaz de aprender, transformar e concretizar?». Esta mudança é mais do que semântica; é estrutural. É a passagem do track record para o potencial. E redefine o papel do recrutador, desafiando o conforto dos modelos tradicionais de talento.
O futuro do recrutamento não é reconhecer o que alguém já fez. É identificar quem será capaz de fazer o que ninguém fez antes. É como lançar uma sonda para um planeta desconhecido.
As histórias de sucesso ainda importam, sim. Mas o que nelas interessa não é o resultado, é o «como». Como alguém pensou, reagiu, colaborou, inovou. As competências que revelam atitude, não apenas execução.
Recrutar, hoje, é um exercício de previsão. E, em funções de liderança, é quase uma arte: escolher quem terá a agilidade mental e emocional para lidar com desafios que ainda nem sabemos nomear.
Curiosamente, já sabemos fazer isto. Sempre que recrutamos um estagiário, avaliamos curiosidade, motivação, adaptabilidade. O que antes era exclusivo do talento jovem, agora aplica-se a todos; dos recém-formados aos diretores. Hoje, recrutar é preparar o terreno para o incerto. Não se trata de preencher organigramas. Trata-se de imaginar o que vem a seguir; e encontrar quem tem a capacidade de o construir.
Esses profissionais existem. São inquietos, autodidatas, inconformados. Aprendem sozinhos, questionam o status quo e transformam incerteza em oportunidade. São os que, enquanto outros esperam instruções, já estão a «prototipar» o futuro. São os resilientes e, quiçá, neurodivergentes (alguém que pensa de forma diferente do tradicional).
A pergunta é: as empresas estão preparadas para os contratar? Muitos processos ainda medem o que é fácil medir: experiência, anos de função, histórico. Mas nada disso garante o que realmente importa: a capacidade de criar o que ainda não existe.
O futuro do recrutamento não é reconhecer o que alguém já fez. É identificar quem será capaz de fazer o que ninguém fez antes. É como lançar uma sonda para um planeta desconhecido: não contratamos quem sabe o caminho; contratamos quem sabe descobrir novos caminhos.
No fundo, o recrutamento do futuro é como uma jam session de jazz: os melhores não são os que tocam sem erros, são os que sabem improvisar perante o imprevisto. E isso requer talento, disciplina e muitos anos de afinação interior.
Pedro Branco (na foto), Founder e Chief Executive Officer (CEO), Pedro Branco & Partners

A Pedro Branco & Partners é um boutique office dedicado a executive search, desenvolvimento de liderança e programas de performance executiva. Foi criada por Pedro Branco, um profissional ligado a recursos humanos que além da carreira em consultoria tem estado profundamente envolvido na academia (é coordenador executivo e docente da Pós-Graduação em Desenvolvimento Organizacional na Universidade Católica Portuguesa e docente convidado na Universidade Europeia, em Portugal, onde leciona cursos de gestão estratégica de recursos humanos, liderança e desenvolvimento organizacional».
Pedro Branco tem apoiado líderes e organizações em múltiplos sectores, incluindo tecnologia, indústria transformadora, consumo, ciências da vida, serviços financeiros, entre outros. A sua experiência abrange executive search, gestão de carreiras, executive coaching e programas de desenvolvimento de líderes. Fluente em português, castelhano, inglês e francês, aporta ainda uma perspetiva internacional, construída através da sua colaboração com a Global Executive Search Network, onde representou Portugal.
A Pedro Branco & Partners passou já este ano a integrar o HTP Group, uma das principais empresas europeias de executive search e consultoria, especializada em apoiar organizações nos seus processos de transformação digital. Tem escritórios em Bruxelas, Frankfurt, Genebra, Londres, Milão, Paris, Pisa, Oslo e Roterdão, contando ainda com parceiros locais nas principais regiões da Europa.
