IA e recrutador, uma relação de futuro

Restam poucas dúvidas de que a inteligência artificial (IA) está cada vez mais presente no nosso dia-a-dia. Está a conquistar espaço e podemos vê-la em coisas tão simples como o sistema de identificação de rosto no nosso smartphone ou de reconhecimento de voz.

Texto: António Loureiro Foto: DR

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Também na área de especialização em que trabalho, a de recrutamento de TI (tecnologias de informação), se tem feito notar o impacto da IA. É notório o papel cada vez mais importante que tem vindo a desempenhar neste sector dos recursos humanos, potenciado sobretudo pelo grande volume de candidatos para os cargos disponibilizados pelas empresas e pelo apoio que a utilização desta tecnologia proporciona nos processos de recrutamento.

É verdade que o recurso a ferramentas de IA traz um aporte grande na forma, mais eficiente, com que se consegue agilizar algumas etapas dos processos de seleção de profissionais. Reconheço o seu papel na triagem de currículos, nas entrevistas virtuais ou na análise de comportamento, por exemplo. Ao mesmo tempo, permite melhorar substancialmente a diversidade dos candidatos, assim como a própria experiência destes durante as várias etapas da seleção.

No entanto, e apesar de todas as vantagens que possamos retirar das tecnologias, há sempre um «mas» nestas coisas. A IA não substitui nem o julgamento humano nem a relação de empatia (ou não) que se cria com o candidato, aspetos de extrema importância em qualquer que seja o processo de recrutamento de um profissional para uma empresa.

Primeiro, porque só o «recrutador humano» tem capacidade para tomar decisões com base em fatores como a intuição, a experiência, as skills interpessoais ou até mesmo aferir a compatibilidade do candidato com a equipa que pretende integrar. Todos eles indicadores que a IA está longe de conseguir avaliar.

Depois há outro fator, não menos importante, que se prende com o relacionamento e a empatia que se cria entre recrutador e candidato. Ao contrário da conexão pessoal que o recrutador humano é capaz de estabelecer com o candidato, a IA não consegue ser empática ou compreensiva. Pelo menos por enquanto. Por outras palavras, embora a IA seja, sem margem para dúvidas, uma valiosa ferramenta nos processos de recrutamento, ela não pode, nem deve, substituir totalmente o papel humano.

Então, para aonde caminhamos? A realidade diária de quem está na área dos recursos humanos dá-nos mais do que evidências de que esta atividade está a passar por uma grande transformação, a começar pelo papel do próprio recrutador que tem, necessariamente, de evoluir, de aprender todas as skills possíveis e de se adaptar ao que as novas tecnologias trazem de bom para o desempenho da sua atividade.

Cabe-lhe assumir uma função mais estratégica, focada na procura de talento, no envolvimento do candidato com a proposta e a cultura organizacional que lhe é apresentada aquando da contratação. Por sua vez, à IA caberá tão somente a tarefa de se concentrar-se nas componentes mais operacionais e com grande volume de informação. Isto porque, apesar da sua importância, no final do dia é o talento, a expertise e o conhecimento de cada recrutador, «o humano», que consegue selecionar o melhor candidato para uma empresa.

O norte-americano Marvin Minsky, considerado o pioneiro na área da IA, acreditava que, no futuro, as máquinas poderiam pensar e eventualmente oferecer uma maneira de resolver alguns dos maiores problemas da humanidade. Mas, e apesar deste cenário ainda longínquo e da evolução acelerada da tecnologia, estou em crer que o fator humano continuará a ter um papel preponderante quando o que está em causa são relações interpessoais, tão importantes no processo de escolha de um candidato. 

E, mais uma vez recorrendo a Minsky, lembro que no seu livro «A Sociedade da Mente» dizia que «a inteligência não é produto de nenhum mecanismo singular, mas vem da gestão de interações feitas por agentes engenhosos». Por isso, como agentes engenhosos que somos, cabe-nos a nós, humanos, saber manter um equilíbrio e um relacionamento saudáveis entre as características humanas e aquilo que a IA nos pode dar. Afinal, a IA está aí para nos servir e não o contrário.

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»»»» António Loureiro é o chief executive officer (CEO) e fundador da Conquest One, consultora multinacional especializada em IT Staffing e que atua em serviços de Outsourcing e Headhunting. A consultora tem duas décadas de atividade.