Responsabilidade dos instrumentos de trabalho no trabalho remoto
Um desafio para empresas e colaboradores

A melhoria da legislação sobre teletrabalho tem sido historicamente assumida no debate mediático e na concertação social, estando atualmente em discussão o «Livro Verde do Futuro do Trabalho 2021», uma prioridade legislativa para o futuro próximo.

Texto: Susana Almeida Lopes/ Américo Fragoso

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O debate tem-se centrado na densificação da adoção de modelos híbridos (trabalho presencial e a distância) no quadro da relação de trabalho, e também na determinação da responsabilidade pelo pagamento das despesas e dos custos emergentes deste modelo.

Pela incerteza e peças posições titubeantes que têm sido adotadas sobre o tema não pretendemos antecipar o caminho da imputação de custos e/ ou responsabilidade das despesas decorrentes do trabalho a distância ou teletrabalho, mas antes refletir preliminarmente sobre os desafios (e também as oportunidades) que este novo modelo pode representar.

É atualmente inequívoco que, na falta de estipulação contratual em matéria de teletrabalho, somente os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação deverão pertencer à empresa. Sucede, contudo, que a prestação de trabalho a distância pode implicar um grupo adicional de instrumentos essenciais para o exercício das funções, como por exemplo secretária, cadeira, equipamento de escritório, etc, que não sendo tecnologias de informação são, ainda assim, cruciais para o adequado desempenho das funções.

Tratam-se quer de consumíveis essenciais ao trabalho como de assegurar as condições físicas e ergonómicas para que o trabalho possa ser realizado com comodidade, garantes da saúde ocupacional e psicológica (por exemplo, a iluminação).

Ora é precisamente neste aspeto que identificamos um desafio a ser enfrentado a curto prazo pelas empresas, porquanto se antecipa um alargamento do conceito de instrumentos de trabalho quando o trabalho é realizado a distância, o que poderá implicar uma maior oneração das empresas.

É verdade que a questão não se tem suscitado com premência nas empresas, o que resulta essencialmente da atual omissão legislativa sobre a matéria num contexto pandémico em que o trabalho a distância ou teletrabalho imposto – estilo «Covid-19» – tem funcionado sem grandes condicionalismos e com uma grande incerteza legislativa.  

Antecipando a regulamentação futura sobre os instrumentos de trabalho, é recomendável que as empresas se antecipem e fixem, desde já, as suas próprias regras, sob pena de serem confrontadas posteriormente com soluções impostas que lhes sejam mais onerosas ou que não se adequem às particularidades do negócio e dos colaboradores.

É ainda mormente importante responder apropriadamente às situações dos colaboradores. Muitas empresas portuguesas implementaram a boa prática de realizar um survey para verificarem as condições de trabalho em casa para poderem apoiar os colaboradores de forma individualizada. Outras boas práticas passaram pela transferência integral ou de alguns elementos do posto de trabalho da empresa para a casa do colaborador e pela compra de equipamento para a casa.

É de salientar que as referidas práticas, apesar de terem custos associados, são identificadas como tendo um custo igual ou inferior aos custos relacionados com transportes, água e luz, em que as empresas deixaram de incorrer.

Apoiar os colaboradores nesta fase difícil é uma boa prática que se refletirá, seguramente, em níveis de motivação, engagement e retenção mais elevados.

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»»»» Susana Almeida Lopes é managing partner da SHL Portugal; Américo Fragoso é associado coordenador da Vieira de Almeida (VdA)