Retoma: aspetos psicológicos e jurídicos do teletrabalho

A rapidez com que as empresas se adaptaram ao novo contexto pode fazer-nos questionar porque não adotámos anteriormente o teletrabalho. Há muito que se anunciava esta tendência, mas tardava a afirmar-se.  Não era a falta de regulamentação laboral, porque essa existia, mas a resistência à mudança típica da nossa humanidade, associada à falta de confiança na produtividade à distância.

Texto: Susana Almeida Lopes/ Américo Oliveira Fragoso

 

O que era fortuito ou uma regalia das empresas da moda, é agora uma realidade. Tornou-se evidente que o teletrabalho é exequível para muitas atividades e que muitos daqueles que eram os receios não só parecem ser infundados, como inclusivamente tem sido demonstrado que existe um conjunto de vantagens que não são despiciendas.

Para os colaboradores, podemos equacionar um maior work-life balance. É ainda possível usufruir da música enquanto se trabalha, eliminar os transportes públicos e o tempo da deslocação, aumentar a produtividade com maior foco e menos interrupções.

Para as empresas, existem benefícios decorrentes da redução de custos como o espaço, uma variável importante tendo em conta os valores do mercado imobiliário. A retenção de talento, pela integração do work-life balance no portefólio de benefícios, não é de descurar. Há ainda o tema da produtividade, que os estudos indicam ser maior em teletrabalho.

Mas há muitos desafios a equacionar, quer de índole jurídica, quer da perspetiva do bem-estar dos colaboradores. Desde logo, deve continuar a haver momentos de ida à empresa, de contacto pessoal com a equipa, de partilha. Compete a cada empresa encontrar o balanço certo entre o teletrabalho e o trabalho presencial, de acordo com os seus objetivos, o negócio e a cultura. O teletrabalho não é a panaceia de todos os males, e pode trazer isolamento e até dificuldade em «desligar», o que se traduz num fenómeno jurídico perverso de total esbatimento de tempos de trabalho e de descanso.

Salientamos também os desafios na gestão dos colaboradores, em particular o controlo.  Em termos jurídicos, este é um tema que carece ainda de clarificação porque a regulamentação atual remete para o regime laboral comum, o qual nem sempre se ajusta bem. Associada ao distanciamento físico, está uma maior responsabilização dos colaboradores na apresentação de resultados, o que se aproxima do modelo de prestação de serviços em que o que efetivamente releva é o resultado. Estamos perante um tema de auto-responsabilização e de confiança. O sucesso mede-se mais pelos resultados do que pelo cumprimento dos horários, sem que isso signifique que os mesmos não são relevantes.

O teletrabalho, com orientação à distância, não é aplicável a todas as funções, nem a todos os colaboradores. É recomendável o ajuste à realidade de cada empresa, através da fixação de regras e princípios. Por força da pandemia e consequente imposição legal do teletrabalho, a verdade é que muitas empresas apenas se limitaram a ajustar ao momento os desafios que o novo regime ia fazendo emergir.

Finda esta fase, é altura de as empresas, proactivamente, transportarem o conhecimento adquirido para regularem o teletrabalho. É também altura de conhecerem melhor o perfil de cada colaborador em relação ao teletrabalho. As necessidades individuais, de maior ou menor socialização, maior ou menor necessidade de controlo, diferem de acordo com o perfil pessoal e a fase da carreira.

A SHL desenvolveu um estudo para compreender os comportamentos necessários para a eficácia em teletrabalho. Encontrou três dimensões que importa avaliar: 1. os hábitos de trabalho do colaborador; 2. as relações de trabalho – por exemplo, até que ponto é autónomo e qual a capacidade para se concentrar; e 3. o auto-desenvolvimento – por exemplo, proatividade no desenvolvimento profissional, iniciativa.

 

Nota: a SHL Portugal e a sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA) vão realizar amanhã, 5 de junho, pelas 11H30, um webinar sobre este tema. Mais informações aqui.

 

 

 »»» Susana Almeida Lopes é managing partner da SHL Portugal; Américo Oliveira Fragoso é associado coordenador da Área de Laboral da sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA).