Consultoria RH
Perceber as necessidades das empresas

Quatro empresas de consultoria cujas atividade tocam a área de recursos humanos partilham algumas mudanças dos últimos tempos, necessariamente condicionados pelo contexto pandémico. Insights importantes de especialistas que nos ajudam a perceber muitas das necessidades do tecido empresarial.

Texto: Redação «human»

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Um especialista da High Skills – Formação e Consultoria, João Machado dos Santos, que coordena as áreas de Banca e Gestão de Projetos na consultora, começa por recordar o escritor colombiano Gabriel García Márquez e o seu famoso romance «O Amor nos Tempos de Cólera», assinalando que quando lhe foi pedida uma pequena abordagem ao tema da formação e da consultoria no contexto pandémico em que vivemos, quase de imediato a memória o levou à história do Nobel colombiano, sobretudo «pelo que é referenciado em título», mas também «pelo seu fulgor imaginativo, palas aventuras e desventuras da felicidade humana e pelo seu realismo mágico», explica.

Na sua opinião, «a formação e a consultoria, vistas como um ativo, mais até do que como um investimento, são uma realidade cada vez mais presente na gestão, dado o contexto século XXI que as empresas e outras as instituições vivem: gestão corporativa, gestão de competências, mudanças legais e regulamentares em crescendo, mudança de hábitos de conhecimento e de consumo, evolução tecnológica em dinâmicas nunca vistas, entre outros fatores». E «sendo a formação e a consultoria para a High Skills duas áreas sempre ligadas, quando a sua qualidade é garantida por uma equipa experiente têm um contributo, eventualmente até de alguma intangibilidade, mas um contributo inequívoco para a melhoria do desempenho corporativo». Mais: «Curiosamente, a cólera (a pandemia) não mudou este paradigma. Talvez até o tenha reforçado, e falo da minha experiência destes (longos) meses. Bem sei que os formatos presenciais têm vantagens expressivas, desde logo uma maior socialização e meios adjacentes relevantes (os quadros em sala são sempre muito úteis). Também sei que há matérias em que é muito difícil, se não impossível, lecionar ou validar sem ser no modelo presencial. Mas felizmente, e graças às tecnologias disponíveis, foi possível dar seguimento a este processo de crescente procura de conhecimento através da formação, no qual consigo ver várias vantagens para todas as partes envolvidas

João Machado dos Santos cita duas vantagens: «Primeira, razões de menor custo para as empresas contratantes, desde logo deslocações, por exemplo; segunda, numa única ação temática, através das plataformas disponíveis é muito mais fácil reunir pessoas de várias geografias e valências diferentes, o que enriquece muito os programas.»

Para o especialista, «estes novos formatos talvez sejam mais cansativos, mas a produtividade das iniciativas não resultou prejudicada». E acrescenta: «Não sei o que vai ser o futuro, mas sinto que vai ser diferente. Mas sei já que a média de presença nas minhas áreas aumentou de forma expressiva. E sei também que os contactos e a interação que resultaram dessas ações também aumentou. Tivemos que nos adaptar; a forma de expressão, ajustamento de grafismos, conteúdos adaptados às novas dinâmicas. Nada de disruptivo.» A propósito disto, cita Fernando Pessoa, numa famosa frase publicitária: «Primeiro estranha-se, depois entranha-se.»

João Machado dos Santos, da High Skills, entende que «a formação e a consultoria, vistas como um ativo, mais até do que como um investimento, são uma realidade cada vez mais presente na gestão, dado o contexto século XXI que as empresas e outras as instituições vivem».

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Implementação ou reconfiguração estratégica do sistema de gestão da formação

Ainda na consultoria, mas também ligada à área da formação, Alda dos Santos Neves, partner da B-Training, Consulting, começa por afirmar que «contextos marcados pela imprevisibilidade exigem respostas rápidas e inovadoras» e que «esta é uma premissa que ganha todos os dias cada vez mais sentido na vida das organizações e que recentemente vimos ser validada num contexto completamente disruptivo, em que o formato digital e remoto assumiu o comando dos negócios e das relações pessoais e institucionais».

Neste âmbito, assinala, têm verificado, por parte da generalidade das organizações, «uma grande procura e aposta em serviços especializados de consultoria focados na implementação ou reconfiguração estratégica do sistema de gestão da formação, tendo em conta a integração da formação a distância na oferta de serviços formativos». Mais: «Neste processo de apropriação e/ ou transformação, as organizações procuram, nos serviços de consultoria externa, orientação e soluções inovadoras para que as suas práticas de gestão da formação a distância sejam erguidas com solidez, garantindo a sustentabilidade futura do investimento realizado. Com efeito, pensar e configurar estrategicamente um sistema de gestão da formação a distância implica identificar respostas focadas no futuro que possibilitem a integração de todas as mais-valias associadas com os processos de aprendizagem realizados a distância.»

Segundo Alda dos Santos Neves, para que isto possa ser uma realidade, é fundamental:

– «pensar conceptualmente o que distingue a formação a distância da formação presencial (e quando falamos de formação a distância não estamos a falar de práticas que se resumem à formação dita on-line, realizadas através de ferramentas de videoconferência)»;

– «definir a política de formação associada à formação a distância, a qual será estruturadora da oferta formativa a conceber e do modelo pedagógico a adotar nos processos de aprendizagem»;

– «validar em que medida as equipas, envolvidas na gestão da formação a distância, detêm as capacidades e competências necessárias para comandar e concretizar esta nova procura»;

– «identificar os recursos tecnológicos mais pertinentes para suportar o desenvolvimento da formação a distância e a sua efetiva gestão operacional; por exemplo, identificar a plataforma de gestão das aprendizagens (LMS – Learning Management Systems) e as ferramentas digitais de suporte à gestão da formação que se assumem como mais adequadas»;

– «alinhar as novas práticas, recursos e infraestruturas para garantir procedimentos concertados e estrategicamente articulados, ao nível do planeamento, do desenvolvimento e da avaliação da formação a distância».

A especialista conclui assinalando que, «numa perspetiva de desenvolvimento futuro da gestão da formação a distância, exige-se uma articulação dos processos de gestão estratégica e pedagógica da formação, em plena associação com os princípios de qualidade que referenciam a gestão da formação».

«Tem-se verificado, por parte da generalidade das organizações, uma grande procura e aposta em serviços especializados de consultoria focados na implementação ou reconfiguração estratégica do sistema de gestão da formação», conta Alda dos Santos Neves, da B-Training, Consulting.

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Digitalizar a consultoria, uma nova era

Tiago Nunes, operation manager do Grupo Nucase, que é especializado no apoio empresarial nas áreas da contabilidade, fiscalidade, gestão de recursos humanos e consultoria de gestão, constata que «passado mais de um ano sobre o início da pandemia, podemos com toda a certeza afirmar que a inovação digital veio para ficar» e que «todos os negócios sentiram necessidade de se reinventar, adaptar, analisar e melhorar a sua eficiência e processos para resistirem à crise – houve um salto tecnológico de muitos anos para que o mundo não parasse».

O especialista assinala ainda: «Certo é que em empresas de venda de produtos físicos, as lojas on-line ganharam um novo significado e foi o sucesso de muitos negócios. No entanto, para empresas de prestação de serviços a transformação teve que ir mais além. O teletrabalho, a comunicação com o cliente e a troca de documentos puseram o digital num patamar que até agora ainda estava distante. E a verdade é que a transformação digital representa uma oportunidade para as empresas se tornarem mais competitivas no mercado e mais inteligentes na forma como se relacionam com os clientes.»

A digitalização de documentos, segundo Tiago Nunes, «foi talvez uma das maiores transformações: os documentos contabilísticos e fiscais que se arquivam em pastas foram facilmente transformados em arquivo digital., isto quando o que era comum era imprimir e arquivar em dossiês, o que deu lugar a plataformas digitais de troca de documentos, reduzindo assim os custos e a pegada ecológica – além disso, assistimos a uma maior segurança de informação e modernização do serviço ao cliente, mais eficiente e sem necessidade de deslocações».

Tiago Nunes refere ainda que «as novas tecnologias como cloud e big data vieram ajudar a que se torne este processo mais simples». Ou seja: «Ter a informação digitalizada torna mais fácil a preservação, o acesso e a partilha. Implementar uma gestão moderna trará um aumento de produtividade a curto, médio e longo prazos. A tecnologia automatiza e minimiza a necessidade de tarefas burocráticas. É daqui que surgirão novos instrumentos digitais que permitiram o lançamento de novas ferramentas e de novos serviços.» Na sua opinião, «os empreendedores de amanhã são os de uma geração digital, pessoas de tecnologia que não querem manusear papel nem perder tempo em deslocações, que querem a praticidade e a simplicidade». E «é nisso que as empresas devem apostar: em modernizar, digitalizar e simplificar os processos com os clientes».

Tiago Nunes, do Grupo Nucase, partilha: «Ter a informação digitalizada torna mais fácil a preservação, o acesso e a partilha. Implementar uma gestão moderna trará um aumento de produtividade a curto, médio e longo prazos.»

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Foco na segurança e nas pessoas

Na Willis Towers Watson, Ana Amado, director para a área de Retirement, começa por referir o «Inquérito Rápido e Excecional às Empresas (Covid-IREE)», promovido pelo Instituto Nacional de Estatística e pelo Banco de Portugal, na primeira quinzena de fevereiro deste ano, que mostra que 92% das empresas estavam em produção ou funcionamento, o que compara com 82% na primeira quinzena de abril de 2020.

Sobre estes dados, comenta: «Em ambas as situações, independentemente da forma, remota ou presencial, em que estas empresas estavam a operar, todas as áreas de suporte se mantiveram também em operação. A área de recursos humanos (RH) foi uma das que assistiu a um aumento significativo de solicitações, uma vez que necessitou de implementar, e articular, todos os novos processos associados à situação de exceção que estava a ser vivenciada, além dos processos e projetos regulares, muitos deles resultantes de requisitos legais.»

A especialista assinala que na Willis Towers Watson trabalham essencialmente com as áreas de RH e que «foi clara a imediata redefinição de processos, a revisão de benefícios, a reavaliação da prioridade dos projetos, sempre com o objetivo de proporcionar a melhor experiência, em segurança, aos seus colaboradores, e a maioria destes projetos têm, de forma mais evidente ou mais discreta, um ponto comum: o bem-estar dos colaboradores.»

Mais: «No caso dos vetores emocionais, psicológicos e físicos do bem-estar, assistimos a um aumento da procura das soluções de EAP (Employee Assistance Program), que apesar de não ser uma solução recente teve um crescimento significativo, junto dos nossos clientes, e respetiva divulgação junto dos seus colaboradores, mesmo para as empresas que já tinham este tipo de programa. Por outro lado, medicina ‘on-line’, oferecida em alguns seguros de saúde, também ganhou novos adeptos, assim como se assistiu a um focus na saúde mental.»

Ana Amado diz ainda que «quando olhamos para o bem-estar financeiro, verificamos um aumento na procura de seguros de vida, certamente resultante do receio da eventualidade de morte ou invalidez, e a um aumento dos valores subscritos em fundos de pensões, PPRs [planos poupança-reforma] e seguros de capitalização». Segundo o INE, refere, a pandemia levou a uma poupança adicional que rondou os 18 mil milhões de euros, ou seja, mais do dobro face ao momento pré-pandemia. Acrescenta também: «Ainda nesta ótica, assistimos a um crescente interesse em sessões de formação financeira e de investimentos, uma vez que, no final do primeiro trimestre de 2020, houve uma quebra dos mercados de ativos financeiros. Foi necessário relembrar os princípios inerentes ao risco de curto prazo e de longo prazo das várias classes de ativos. Associada a estas sessões informativas, que permitem aos colaboradores um maior conhecimento e, consequentemente, uma maior tranquilidade, foram introduzidos e/ ou relembrados os simuladores de pensão, sejam eles apenas referentes ao plano de pensões corporativo ou integrados com a pensão da Segurança Social.»

De notar ainda «um aceleramento da digitalização, mesmo em benefícios como os planos de pensões, que tipicamente (mas não necessariamente) requerem o preenchimento de vários impressos». Ou seja: «Eliminámos os processos em papel, mesmo quando os mesmos envolviam reformados e beneficiários. Todos os processos de revisão de opções de planos de pensões passaram a ser digitais e assistimos a um aumento médio duas vezes superior ao nível da participação por parte dos colaboradores, não só porque as pessoas estavam mais preocupadas com as suas poupanças, incluindo a reforma, mas também porque a facilidade com que passaram a poder fazer as suas escolhas, em sua casa, estava à distância de um clique.»

No caso de programas de benefícios flexíveis, refere a especialista, «houve uma alteração do padrão na oferta do menu de benefícios e na seleção de determinados benefícios em detrimento de outros: o benefício passe social deixou de ser relevante e houve um maior interesse por benefícios associados ao trabalho remoto».

O contexto pandémico fez-se igualmente sentir de uma perspetiva relacionada com a cibersegurança, ao propiciar um aumento significativo da superfície de ataque. Ana Amado cita o «Relatório Anual do Centro Nacional de Cibersegurança», afirmando que em 2020, apenas em Portugal, verificaram-se 1.347 incidentes, o que representa um aumento de 79%. «Este aumento deveu-se ao crescente aumento do digital, no quotidiano das pessoas, mas também é fruto das vulnerabilidades provocadas pelo trabalho remoto, que expõem as organizações a riscos de segurança significativos», comenta, para ainda acrescentar: «Assim, os impactos reputacionais e financeiros subjacentes a este tipo de eventos levam cada vez mais as empresas a colocar os riscos cibernéticos no topo da agenda e a elevar o nível de maturidade na gestão deste tipo de riscos, a que se junta o interesse em implementar mecanismos de transferência de riscos (seguros específicos) para acautelar muitos dos impactos financeiros passíveis de serem sofridos pelas organizações.»

No fundo, conclui Ana Amado, «houve um acelerar da utilização da tecnologia como forma de ultrapassar limitações do trabalho remoto, a digitalização de vários processos, um foco na segurança, priorizando as pessoas e a experiência dos colaboradores».

«Houve um acelerar da utilização da tecnologia como forma de ultrapassar limitações do trabalho remoto, a digitalização de vários processos, um foco na segurança, priorizando as pessoas e a experiência dos colaboradores», explica Ana Amado, da Willis Towers Watson.