Não conhecia o seu mercado de trabalho e não tinha a mínima consciência do seu preço. Não acautelou a sua empregabilidade, mantendo atualizadas as suas competências e a sua rede de contactos (networking). Também não soube trabalhar a sua marca pessoal, e não manteve o foco em nenhum objetivo de carreira.
Por Pedro Branco
Quando o Paulo recebeu o convite do Bernardo, o seu novo diretor, para um café a meio da tarde, no bar da pousada, não estranhou: já não era o primeiro e já sabia ao que ia. Depois de uns anos no estrangeiro, o Bernardo estava de regresso à sede do instituto. Com a mudança da cor partidária no governo, havia várias restruturações em curso, e o primeiro desafio do Bernardo, enquanto diretor do instituto, era extinguir o departamento do Paulo e despedir todos os colaboradores. Depois de algumas peripécias, consumou-se o ato. O Paulo foi despedido, mas com tudo aquilo a que tinha direito: acerto final de contas, indemnização, carta de recomendação (igual à dos restantes 14 colegas despedidos naquela fase) e a vã promessa de apoio na procura de emprego. Afinal, o instituto ainda gozava de grande reputação e influência.
O Paulo não se assustou. Apesar de aquele ter sido o seu primeiro emprego e de lá estar havia oito anos, ainda era jovem e estava certo de que depressa conseguiria voltar ao trabalho. Afinal, nem todos se podiam dar ao luxo de exibir no curriculum vitae uma experiência profissional de oito anos em tão prestigiada instituição.
Vinha de uma família humilde e orgulhava-se de o seu trajeto assentar exclusivamente no mérito. Agastava-se, contudo, por assistir no instituto à entrada de pessoas mais novas, e mais bem relacionadas, para lugares de maior destaque. Porém, devido às boas condições de que gozava (remuneração, benefícios, horário, etc), acabou por se acomodar à situação.
Para ele, ao contrário dos restantes colegas, esta situação representava essencialmente uma oportunidade de desenvolvimento de novas competências e de progressão profissional.
Enviou inúmeras candidaturas espontâneas, respondeu a vários anúncios e inscreveu-se em diversas empresas de recrutamento, mas não pediu nada a ninguém. As respostas às candidaturas espontâneas tardavam, e quando chegavam eram regra geral negativas. Foi relativamente bem-sucedido nas respostas aos anúncios, mas nenhuma proposta o interessou; ou porque não se identificava com a função, ou porque o salário não era minimamente ajustado. Não sabia exatamente o que queria, mas sabia que não era aquilo.
Os meses foram passando, e o Paulo começava a ficar cada vez mais preocupado e envergonhado com a situação. Se inicialmente não pediu ajuda porque «não precisava», agora sentia-se envergonhado por estar desempregado. Passou um ano e esgotaram-se as prestações do subsídio de desemprego, pelo que, a partir daquele momento, aceitaria a primeira oferta que lhe fizessem. Percebeu que aqueles oito anos no instituto lhe haviam dado competências que agora não cabiam em mais lado nenhum.
Acabou por aceitar trabalhar num contact center, num sector onde não tinha nenhuma experiência. Começou do zero, desenvolveu novas competências, evoluiu, foi mudando de empregador, construiu uma carreira e acabou por recuperar, na generalidade, o seu antigo nível de vida.
Afinal, o que correu mal? Bom, quase tudo. Em primeiro lugar, o Paulo não conhecia o seu mercado de trabalho e não tinha a mínima consciência do seu preço. Não acautelou a sua empregabilidade, mantendo atualizadas as suas competências e a sua rede de contactos (networking); usou apenas os canais tradicionais, menos eficazes; isto é, candidaturas espontâneas e respostas a anúncios. Também não soube trabalhar a sua marca pessoal e, enquanto tentava voltar ao mercado, não manteve o foco em nenhum objetivo de carreira e andou à deriva, sem saber para aonde ir.
Era possível o Paulo ter gerido a situação de forma diferente, de modo a ser mais bem-sucedido a reentrar no mercado de trabalho? Sim, era. Disso, falaremos numa próxima ocasião.
Pedro Branco é diretor executivo da NextMove