Apresentamos a segunda parte de uma entrevista com Carla Rocha, que recentemente publicou o seu terceiro livro, «Fale para Ser Ouvido», com a chancela editorial da Planeta. Nos próximos dias publicaremos a terceira e última parte. Carla Rocha é uma das vozes mais conhecidas da rádio em Portugal e ao mesmo tempo uma referência em comunicação no mundo corporativo.
Texto: Redação «human» Fotos: Fernando Piçarra
Os seus três livros referem o verbo «falar» no título, o terceiro inclusive refere «ser ouvido». Mas tem um tópico onde aborda o silêncio. O que a levou a incluí-lo?
O silêncio é uma parte essencial do processo de comunicação, mas não estamos habituados a encará-lo desta forma. Fomos educados para ter a resposta na ponta da língua, mais do que para saber ouvir. O silêncio ainda nos causa desconforto e por vezes é encarado como falta de conhecimento ou de opinião. Gostava que este terceiro livro, «Fale para Ser Ouvido», incentivasse as pessoas a olhar para o silêncio por outra perspetiva, como uma estratégia poderosa para comunicar melhor. Numa apresentação, por exemplo, uma pausa no momento certo chama a atenção e torna a mensagem mais impactante. Numa reunião de equipa, um líder também precisa de criar momentos de silêncio e de reflexão para que as suas equipas possam processar a informação. Numa conversa mais informal, o silêncio permite que os outros tenham tempo para se expressarem, sem interrupções – e permite-nos pensarmos melhor antes de respondermos. Verbalizar tudo o que pensamos no calor do momento, nem sempre é uma boa prática. Isto não significa que não podemos manifestar as nossas opiniões, mas devemos pensar no valor que vamos acrescentar quando interagimos. Isso também contribui para sermos verdadeiramente ouvidos.
Aponta também os cuidados na preparação do que se vai dizer. Nota que a este nível ainda se falha muito em Portugal?
Preparação é tudo, ou quase tudo. Preparar não significa que vamos ter um discurso rígido ou ser pouco naturais. Há sempre espaço para a espontaneidade e o improviso – não podemos prever tudo, e está tudo bem. Mas precisamos de estar confortáveis naquele território, então há que fazer esse trabalho de preparação. E preparar, em comunicação, significa ter uma noção clara do que queremos transmitir, significa compreender a nossa audiência e estruturar a nossa mensagem tendo em conta essa audiência, seja num registo mais ou menos formal. Sinto que em Portugal há cada vez mais consciência sobre esta necessidade, e que os líderes que nos procuram na Carla Rocha Comunicação percebem que uma comunicação musculada sustenta as relações entre as equipas e contribui para o sucesso da organização. Mas ainda há caminho a percorrer, e sobretudo é preciso consistência. Não podemos pensar que vamos preparar só os grandes momentos – uma talk, uma reunião anual. Este cuidado tem de estar no dia-a-dia. Uma conversa entre o líder e um colaborador, para perceber os seus desafios e as suas expectativas, por exemplo, pode ser descontraída, mas isso não significa que não seja preparada por ambas as partes. Há esta fórmula simples, que pode ser interessante ter em mente: o que gostava que o outro soubesse, sentisse e fizesse?
Se pensarmos no mundo das empresas, no mundo da política e até no mundo da comunicação social, o que lhe parece aí a comunicação, falando genericamente? Há muitas diferenças entre esses três mundos?
Os três têm especificidades. O mundo empresarial está focado em resultados, mas há cada vez mais consciência da importância que a comunicação tem no bem-estar, no envolvimento e na mobilização das equipas, como meio de chegar a esses resultados. Por isso tem havido um esforço no sentido de humanizar a comunicação dentro das empresas. No mundo da política, a comunicação é mais estratégica, para definir uma imagem pública ou para criar narrativas que respondem às necessidades da sociedade. É uma construção mais de longo prazo. Na comunicação social, o imediatismo predomina. É preciso rapidez a dar uma notícia, mas ao mesmo tempo é imperativo garantir que a informação é fundamentada e esclarecedora. Há singularidades nestes três mundos, sim, mas também há princípios basilares da comunicação que devem ser comuns: clareza, honestidade, transparência. Comunicar não é apenas transmitir informação. A ideia de construir pontes pode soar cliché, mas é fundamental nas empresas, na política e na comunicação social para estabelecer relações de confiança.

«O silêncio é uma parte essencial do processo de comunicação, mas não estamos habituados a encará-lo desta forma. Fomos educados para ter a resposta na ponta da língua, mais do que para saber ouvir. O silêncio ainda nos causa desconforto e por vezes é encarado como falta de conhecimento ou de opinião.»
Será que podemos dizer que nas empresas se prepara mais a comunicação do que na política? E que na comunicação social o imediatismo leva a que muitas vezes não se possa preparar convenientemente o que se escreve ou diz?
Cada um destes mundos tem uma espécie de relógio próprio. De um modo geral, as empresas estão menos expostas a situações de mudança que exigem respostas imediatas. Têm mais tempo para preparar a comunicação interna e externa, para antecipar e desenvolver as mensagens de forma mais estruturada, e alinhar as equipas conforme o contexto e as necessidades. Já na política, a comunicação tem de ser mais ágil para estar em sintonia com o que acontece no país e no mundo. As narrativas têm de ser permanentemente atualizadas, para seguir o ritmo da agenda política e do debate público. No caso da comunicação social, o imediatismo é grande. O desafio aqui é equilibrar a exigência da velocidade com o tempo de investigação. Não sou jornalista, mas sou da rádio e trabalho com os melhores desta área, e sei que mesmo quando o tempo é escasso, a precisão e a responsabilidade são princípios inabaláveis.
Pode falar-nos de algumas reações que tem tido ao que propõe em termos de comunicação nos seus livros?
Tenho percebido que os meus livros ajudam as pessoas a prestar mais atenção à forma como comunicam. A estarem mais conscientes do impacto que têm. Os três livros são um complemento das academias e formações que damos na Carla Rocha Comunicação e muitas vezes dizem-nos «não tinha pensado nisto desta forma» ou «não me tinha apercebido de que trocar uma palavra por outra pode mudar tanto a forma como sou interpretada». Muitas das estratégias que sugiro nos livros são assim, pequenos ajustes na forma como comunicamos, mas que têm um impacto gigante no outro. E isso para mim é o mais gratificante, perceber que aquilo que partilho se traduz em mudanças práticas – que os meus livros são um trampolim para comunicarmos com mais consciência, mais atenção e mais cuidado com o outro, seja em casa ou no trabalho.
E reações às suas propostas enquanto consultora de comunicação?
O que me deixa feliz é perceber que muitas empresas que nos procuram para ter uma formação, querem continuar o processo. Isso é um reconhecimento, por parte das empresas, de que a competência da comunicação precisa de ser trabalhada de forma contínua – e estamos a sentir essa consciência em vários sectores. Muitas vezes começamos com os chamados «essenciais da comunicação» – técnicas de comunicação ou public speaking, por exemplo –, mas acabamos por perceber, em conjunto com as empresas, que há outros desafios que podem ser solucionados através da comunicação e continuamos a aprofundar o trabalho com as equipas. A comunicação intergeracional, por exemplo, é algo a que as empresas têm dado prioridade e é um trabalho que nos propomos fazer. Também é uma preocupação nossa que as formações tenham uma forte componente prática, ligada à realidade de cada organização. Isso facilita muito a aprendizagem e a aplicação dos conceitos no dia-a-dia. É este o feedback que temos.

«Tenho percebido que os meus livros ajudam as pessoas a prestar mais atenção à forma como comunicam. A estarem mais conscientes do impacto que têm. Os três livros são um complemento das academias e formações que damos na Carla Rocha Comunicação e muitas vezes dizem-nos ‘não tinha pensado nisto desta forma’ ou ‘não me tinha apercebido de que trocar uma palavra por outra pode mudar tanto a forma como sou interpretada’.»
Como a ajudou a sua experiência na rádio a escrever este livro? E a procura por formação, inclusive internacionalmente, ajudou-a ainda mais do que a rádio? Ou estamos a falar de planos completamente diferentes?
São planos diferentes, mas complementam-se. A rádio foi onde tudo começou. Foi onde aprendi os princípios de uma comunicação clara, envolvente, próxima. Foi por acreditar que a rádio tinha muito para ensinar às lideranças e às empresas que comecei a dar formação e que escrevi este e os outros livros. Quando faço um curso, quando vou a uma conferência ou outro tipo de investigação, é sempre no sentido de atualizar o que sei, de incorporar outras abordagens, de trazer novas evidências. O que sabemos sobre comunicação não é estanque. E ainda há um terceiro plano que devo acrescentar que foi importante para a escrita deste livro: o terreno. Aprendo sempre que dou uma formação. E isso também se reflete nos conteúdos que abordo e na forma como são abordados, para serem mais próximos da realidade das pessoas.
Primeira parte da entrevista aqui.
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A AUTORA
Carla Rocha é uma referência na formação em comunicação e storytelling, após uma década como consultora, formadora e empresária. A sua voz é uma das mais conhecidas do país, graças a um percurso de 30 anos como locutora no Grupo Renascença, e a inúmeras campanhas de publicidade. Ao longo de anos, adquiriu formação internacional em diferentes áreas da comunicação e da liderança. Integra a National Speakers Association (Estados Unidos) e tornou-se consultora e formadora em empresas e organizações portuguesas e estrangeiras. A par disso, é professora convidada na Nova School of Business and Economics (Nova SBE), no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) e na Egas Moniz School of Health & Science. Colabora também com a Universidade Católica Portuguesa.
Em 2015, a empreendedora fundou a empresa Carla Rocha Comunicação, especializada em formação e treino de líderes e de equipas, nas áreas da comunicação e da liderança. «Quando comecei era só eu», recorda, para logo assinalar. «Hoje somos 10 pessoas a trabalhar em permanência na empresa e cerca de duas dezenas de formadores e parceiros que se juntam a nós nas academias, nas sessões de formação e nos cursos on-line. Crescemos em pessoas e crescemos na forma como fazemos chegar o nosso propósito aos clientes com que trabalhamos.» É longa a lista de líderes e equipas – nacionais e internacionais – que confiam neste trabalho para transformar a forma como comunicam, resultando em melhorias nas relações e na produtividade. Além das academias «Fale Menos, Comunique Mais» e «Fale Menos, Influencie Mais», a oferta formativa da Carla Rocha Comunicação inclui módulos como Liderança Consciente e Inspiradora, Alinhamento de Equipa, Produtividade e Colaboração, O Poder da Comunicação Intergeracional, Brand Yourself, Estratégias Diferenciadoras de Marca Pessoal, Imagem com Propósito: a imagem como ferramenta de comunicação não verbal e ainda O Poder da Voz – comunique com impacto.
Carla Rocha é autora dos livros «Fale Menos, Comunique Mais» (2016, com relançamento em 2023), «Fale Menos, Influencie Mais» (2019) e «Fale para Ser Ouvido» (2024).
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O LIVRO
Com a chancela da Planeta, «Fale para Ser Ouvido», de Carla Rocha, mostra como num mundo demasiado ruidoso cada pessoa pode fazer ouvir a sua voz.
A editora apresenta assim o livro: «Falar ou calar? A escolha é sua, mas quando fala deve pensar, organizar as suas ideias e preparar-se, porque só assim será realmente ouvido e alcançará os seus objetivos./ Todos nós estamos em constante interação com os outros, mas será a nossa comunicação eficaz? Somos ouvidos? Conseguimos alcançar os nossos objetivos?/ Quando falamos há questões que devemos colocar e decisões a tomar. Que tipo de comunicador sou? Agressivo ou permissivo? Que tipo de mensagem quero passar? Positiva, motivadora? Quem é a minha audiência? Fiz as perguntas certas para conhecer quem me está a ouvir? Coloquei-as no centro da conversa? Que opiniões devo escutar e quais as que devo ignorar? Quando devo lutar por um argumento e quando devo desistir?/ Carla Rocha, apresentadora de rádio, oradora Ted Talks e consultora de comunicação, reúne neste livro − que irá transformar as suas relações pessoais e profissionais − técnicas e estratégicas que o vão tornar um comunicador eficaz. Habituada a treinar CEOs [chief executive officers], empresários, atletas e outros profissionais, Carla Rocha ensina a tornar as suas conversas mais claras, as reuniões mais assertivas e os seus discursos mais empáticos./ Ensina a comunicar com conta, peso, medida e com intenção. E dá acesso exclusivo ao Método Rocha, onde desvenda todos os segredos de uma das técnicas mais poderosas de comunicação: o storytelling. Porque no fundo todos temos uma história para contar. Só precisamos de saber como contá-la de forma mais eficaz.»
https://www.planetadelivros.pt/livro-fale-para-ser-ouvido/411295
