Opinião

Inovações tecnológicas na experiência do candidato: desafios e limites

Texto: Catarina Rego/ Pedro Ferreira Sousa Foto: Freepik @drobotdean

A evolução tecnológica faz-se acompanhar de avanços constantes ao nível da inteligência artificial e da automação de muitos processos, o que conduz a ganhos de eficiência, um elemento distintivo no sucesso dos processos de recrutamento e seleção de hoje.

A experiência do candidato tem sido, nos últimos anos, uma das cinco tendências mais importantes em RH. Organizações que investem na criação de experiências positivas desde o primeiro contacto com os candidatos têm maior probabilidade de reter o talento. Isto acontece porque o resultado desta interação influencia fortemente a imagem da organização enquanto marca empregadora. Os dados indicam que os candidatos pensam que o recrutamento reflete a forma como a organização trata os colaboradores e se baseiam nesta experiência para a recomendar, existindo ainda uma relação entre a experiência de recrutamento e o próprio sucesso no desempenho. Para além disso, proporcionar uma boa experiência tornou-se ainda mais importante para conseguir atrair a reter profissionais qualificados quando estamos perante funções para as quais o mercado de trabalho está, claramente, em procura.

Neste âmbito, é crítico compreender as expectativas dos candidatos para ir ao seu encontro. Transversalmente, são nomeados três aspetos fundamentais aquando da conceção da experiência do candidato: (i) dar a conhecer o negócio e a cultura da empresa desde a fase inicial do processo de recrutamento; (ii) contribuir para a criação de valor para o candidato; (iii) garantir a acessibilidade ao processo de recrutamento através de qualquer dispositivo móvel, já que a maior parte dos candidatos utiliza os seus smartphones ou tablets para tudo.

Assim, as organizações devem apostar na criação de uma experiência do candidato que seja imersiva, cativante e justa. Para isso, podem beneficiar se digitalizarem o processo de recrutamento, criando uma plataforma dedicada à gestão da experiência do candidato. Nesta devem ser incluídos conteúdos sobre a função, área de negócio, valores e cultura da organização. Para além disso, devem ser utilizadas técnicas de seleção objetivas, assentes em ferramentas que permitam: (i) recolher informação sobre as competências críticas para o desempenho da função, garantindo um processo de avaliação robusta e atrativo; (ii) obter rapidamente os resultados, de modo a facilitar a partilha de feedback com os candidatos.

Por outro lado, a inclusão da tecnologia também contribui para um processo de recrutamento mais célere, justo e promotor da diversidade e inclusão, através da redução de enviesamentos durante o processamento simultâneo de grandes quantidades de informação sobre os candidatos. A existência de uma plataforma on-line que centralize todas as etapas do processo de recrutamento – desde o envio da candidatura até à formalização da proposta de trabalho –  fomenta, ainda, maior transparência, agilidade e a sensação de empoderamento nos candidatos, já que o facto de muitas etapas serem on-line lhes permite decidirem o momento mais conveniente para as realizarem.

Congruentemente, tem sido identificado que os candidatos esperam aprender algo sobre si, nomeadamente, sobre o alinhamento do seu perfil à oportunidade a que se candidatam e sobre quais as perspetivas de carreira, o que se traduz noutra mudança. O processo passou a ser ativo e, por isso, deverá contribuir para a criação de valor para os candidatos. Neste contexto, o feedback regular e célere assume um papel de destaque.

De igual modo, acentua-se a agilidade, com a existência de múltiplas interações ao longo tempo, o que possibilita, também, mais oportunidades para que as empresas possam inovar, experimentar e melhorar os seus processos.

Neste contexto, é importante que as organizações atendam ao enquadramento legal dedicado aos processos de recrutamento e que possam, assim, tirar um maior partido do uso da tecnologia, assegurando que as suas plataformas integram funcionalidades em cumprimento com as normas legais vigentes.

Com efeito, a primeira nota a reter contende com as regras de igualdade e não discriminação em função do género, uma vez que, nos termos legais, o anúncio de oferta de emprego e qualquer outra forma de publicidade ligada à pré-seleção ou ao recrutamento não pode conter, direta ou indiretamente, qualquer restrição, especificação ou preferência baseada no género. Recomenda-se assim a criação de parâmetros ou de procedimentos internos que definam regras claras quanto à necessidade de salvaguardar, em todos os momentos dos processos de recrutamento (por exemplo, identificação do perfil da vaga, contactos com potenciais candidatos, entrevistas e critérios de seleção automática ou digital), a igualdade e a não discriminação em função do género do candidato.

Por outro lado, e em decorrência deste ponto, a legislação laboral obriga, sob pena da prática de contraordenação laboral, à conservação, por um período de cinco anos, de um registo dos processos de recrutamento efetuados. Esse registo deve ser organizado com desagregação por sexo e deve conter, entre outros elementos obrigatórios, os convites para o preenchimento de lugares, os anúncios de oferta de emprego, o número de candidaturas apresentadas, o número de candidatos entrevistados, o número de candidatos a aguardar ingresso e os resultados de testes ou provas de admissão ou seleção. Pretende-se assim facultar às entidades fiscalizadoras os elementos necessários à identificação e apuramento de eventual discriminação de candidatos no acesso ao emprego, formação e promoção profissionais e condições de trabalho. Nessa medida, as soluções digitais dedicadas à tramitação e ao acompanhamento de processos de recrutamento deverão, tanto quanto possível, permitir recolher e registar todos estes elementos, de modo a que, mediante solicitação, a organização possa, em termos imediatos ou tendencialmente imediatos, demonstrar o cumprimento das regras e obrigações legais.

Por último, chamamos ainda a atenção para a necessidade de as organizações obedecerem às regras de proteção de dados pessoais no âmbito do tratamento dos dados dos candidatos. A este nível, as plataformas digitais deverão ser desenhadas de modo a garantir, desde logo, a recolha de consentimento para a conservação do currículo para oportunidades ou vagas futuras, a prestação das informações mínimas relativas a esta matéria e o exercício dos direitos dos titulares dos dados pessoais, tais como o direito de acesso, retificação e apagamento dos dados. 

Em suma, a abordagem que impera no momento, e que tudo indica que se deverá manter no futuro, centra-se na personalização e no acompanhamento dado ao candidato, contrariamente ao passado, em que o foco era dirigido ao mercado em massa. Neste âmbito, deverá garantir-se ainda que o tratamento dos candidatos visa a conformidade com as regras de igualdade e não discriminação, assim como da proteção de dados quanto ao arquivo da informação.

Catarina Rego
Consultant na SHL Portugal


A SHL Portugal é uma empresa de consultoria estratégica e de tecnologia para a gestão do talento, representante das soluções do Grupo SHL, que tem uma posição de destaque mundial em assessment talent analytics. A SHL Portugal opera em cinco países de língua portuguesa e trabalhou com mais de 300 organizações nos últimos três anos, dos sectores público e privado. A celebrar 45 anos em 2024, a SHL tem apostado na inovação e na vanguarda da tecnologia para a gestão do talento.

Pedro Ferreira Sousa
Managing Associate da Vieira de Almeida (VdA)


A sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA) é uma organização vibrante e inquieta, inovadora, que se afirma nas aspirações de um coletivo que quer ser parte ativa da solução para os desafios sociais e ambientais que enfrentamos enquanto sociedade, mobilizando pelo exemplo de respeito, justiça e humanidade. Orgulhosa da sua história, a VdA constrói o futuro assente numa cultura que a distingue e que une em torno de um desígnio comum. Uma cultura fundada na consciência de que a cidadania é a âncora da sua prática e que faz dela uma organização aberta, inclusiva e solidária, focada nas pessoas e na justa oportunidade de realização de cada uma.

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