Formação obrigatória

O objetivo da formação profissional nas empresas passa por dotar os colaboradores dos conhecimentos e das competências necessárias ao desempenho da atual ou futura função. Adicionalmente, é consensual que o investimento no desenvolvimento das pessoas é, hoje, uma forma de atrair e, principalmente, reter talento. De igual modo, é sabido que a democratização do conhecimento produz sociedades mais equitativas e justas.

Texto: Francisco Campos Braz/ Nuno Matos de Sousa

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Neste âmbito, o Código do Trabalho (CT) impõe deveres de formação contínua às empresas, mormente o de garantirem um mínimo de 40 horas de formação anual a cada trabalhador (proporcionais à duração do contrato no caso de contratos a termo iguais ou superiores a 3 meses). O objeto da formação deve ter correspondência, por norma, com as funções do trabalhador. Não sendo possível, deverá incidir sobre TICs (tecnologias de informação), SST (segurança e saúde no trabalho) ou língua estrangeira.

O CT estabelece ainda que o empregador deve assegurar a formação contínua anual a, pelo menos, 10% dos seus trabalhadores, permitindo-se que a efetivação da formação seja diferida por 2 anos, período após o qual as horas não asseguradas transformam-se em crédito de horas para formação, o qual caduca ao fim de 3 anos.

Não se questionando a bondade do regime do CT nesta matéria, certo é que as opções normativas adotadas não impedem – até mesmo propiciam – o atual desfasamento entre os seus objetivos e a realidade: os trabalhadores que recebem formação não chegam aos 40%; a média de horas frequentadas não chega aos mínimos legais; e as empresas que asseguram formação não chegam aos 20% (dados do Ministério do Trabalho).

Pese embora o CT preveja que incorrem em contraordenação grave as empresas que não cumpram com as 40 horas de formação anual de cada trabalhador, nem assegurem a formação anual a pelo menos 10% dos seus trabalhadores, a verdade é que o próprio CT possibilita que, no momento da cessação do contrato, as empresas paguem as horas de formação ou o crédito de horas para formação pendentes. O regime legal acaba, assim, por permitir que se «sanem» eventuais infrações em matéria de formação, em detrimento, dir-se-á, de um efetivo cumprimento dos objetivos que ele próprio estabelece.

Aqui chegados, julgamos que parte da solução (a par de eventuais incentivos fiscais a quem cumpra) deverá caber às próprias empresas, num exercício de investimento e adaptação a exigências formativas que, inelutavelmente, são já reclamadas pelas mais recentes gerações a entrarem no mercado de trabalho.

Dito isto, uma questão se coloca: como poderão as empresas assegurar que obtêm o retorno desejado do investimento realizado em formação? A resposta parece simples. Um primeiro passo será recorrer a mecanismos e técnicas de eficaz diagnóstico das necessidades formativas, de modo a conhecer que gaps existem entre as competências atuais detidas pelos colaboradores e aquelas que devem deter para fazer face a novos desafios e aumentar a produtividade e a competitividade da empresa. Assegurar a qualidade pedagógica da solução escolhida para colmatar essas necessidades é outra etapa fundamental, assim como recorrer a ferramentas, tais como o Nudging & Behavioural Insights, que facilitam o processo de transferência dos conhecimentos adquiridos para o desempenho profissional. Claro que há sempre outro caminho: selecionar, das inúmeras soluções da oferta formativa existente, uma que garanta apenas e só os mínimos estabelecidos na Lei.

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»»»» Francisco Campos Braz é associado sénior da Área de Laboral da Vieira de Almeida (VdA); Nuno Matos de Sousa é partner da SHL Portugal