O presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga, EPE, Miguel Paiva, partilha algumas das suas opiniões sobre a importância das pessoas, a formação e a humanização na área hospitalar e no sector da saúde. Segundo afirma, este sector, «pela qualidade e pela diferenciação dos seus recursos humanos e pelo valor social e emocional do serviço que presta, tem condições para criar laços de grande envolvimento dos profissionais».
Texto: Redação «human» (com o apoio da Powercoaching)
O estado da saúde em Portugal é alvo de notícias diárias, nem sempre pelos melhores motivos. De que forma se pode motivar os funcionários neste clima de grande pressão?
A saúde é talvez o sector mais escrutinado publicamente. Não há dia em que os órgãos de comunicação social (vista, escrita e falada) ao nível nacional ou regional não abordem temas de saúde. Muitas vezes as abordagens são justas, mas noutras são superficiais e até destituídas de razão, o que causa grande desgaste nos profissionais, fruto das difíceis condições em que desempenham as suas funções.
Este não é o cenário ideal para motivar os profissionais, pelo que a forma de o conseguir passa por tentar criar um ambiente organizacional que os envolva na definição das estratégias e na tomada das decisões, que apoie as pessoas na forma de lidar com os problemas, que lhes permita desenvolver-se profissionalmente e que lhes demonstre a relevância e valor que a sua atividade cria para a sociedade.
O sector da saúde, pela qualidade e pela diferenciação dos seus recursos humanos e pelo valor social e emocional do serviço que presta, tem condições para criar laços de grande envolvimento dos profissionais. Conseguir este envolvimento é um grande desafio para os gestores.
O Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga conta com mais de 1.900 funcionários. Quais são os pontos fundamentais no seu desenvolvimento e na sua formação?
A formação dos profissionais de saúde tem de abarcar, obrigatoriamente, dois níveis: o nível técnico propriamente dito e o nível relacional e de humanização.
Ao nível da formação técnica, ela está razoavelmente organizada para os principais grupos de profissionais de saúde, como é o caso dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos de diagnóstico e terapêutica ou dos técnicos superiores de saúde. De um modo geral, todos estes profissionais têm uma consciência apurada para a necessidade de atualização permanente, o que ajuda muito. Para além dos programas de formação contínua definidos ao nível das carteiras profissionais, a própria organização cria programas formativos em função de determinados objetivos que vão surgindo, como seja a abertura de novos serviços, por exemplo. Nos restantes grupos profissionais, nomeadamente os que apoiam a prestação de cuidados ou os que trabalham em áreas de logística e gestão, a formação é direcionada para aspetos concretos relacionados com objetivos transversais e específicos de cada serviço. Temos um departamento de formação que elabora e implementa um programa intenso ao longo de cada ano, recorrendo a formação financiada no âmbito do programa «POISE» e outra que a instituição assume.
A par disso, temos também desenvolvido ações de formação que visam trabalhar aspetos específicos como a motivação e as competências emocionais dos profissionais, pois entendemos que só elevando estes aspetos conseguiremos melhorar o atendimento e os cuidados que prestamos aos profissionais.
Na saúde entregamos valor aos nossos clientes/ utentes sob a forma de um serviço que mais não é do que uma interação humana entre um doente e um profissional. Ora, se não cuidarmos de garantir que os nossos profissionais estejam motivados e em equilíbrio interior, será difícil garantir que essa interação seja bem-sucedida.
A instituição que lidera realizou recentemente um programa para mais de 150 funcionários no âmbito da humanização hospitalar. Qual é a importância deste tema para o futuro dos hospitais e da saúde?
Esta ação, que realizámos com a Powercoaching, foi inserida no último aspeto que referi. Como falámos, a pressão existente nos hospitais é muito grande, seja a que é criada pelo grande afluxo de doentes, pelas condições nem sempre perfeitas em que se trabalha ou pelo desgaste inerente ao trabalho por turnos em noites e fins-de-semana privando a família.
Se não olharmos e não trabalharmos o lado emocional destas pessoas, estaremos a descurar uma componente fundamental. Infelizmente, as constantes solicitações que temos e os constrangimentos existentes levam a que este lado seja subalternizado, algo que temos contrariado no Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga.
Estas ações, que fizemos numa primeira instância para as chefias intermédias e depois para os profissionais da primeira linha de atendimento ao público, revelaram-se extremamente frutuosas, tendo criado em todos os participantes uma consciência acrescida sobre o relevo do seu papel dentro da instituição e na própria sociedade e dando-lhes instrumentos para lidarem com a pressão do dia-a-dia.
Trata-se de ações com resultados imediatos muito interessantes, mas sinto que os ganhos só serão perenes se conseguirmos inserir esta abordagem na própria cultura da organização.
Enquanto presidente do Conselho de Administração de um centro hospitalar, como gostaria que fossem os hospitais do futuro?
Os hospitais acompanham a sociedade, e em muitos casos lideram as mudanças que acontecem na sociedade. Por isso, o que espero é que os hospitais sejam cada vez mais espaços que apoiem e fomentem a evolução do saber técnico-científico na saúde, aproveitando essa expertise para o melhor tratamento possível dos doentes. Espero ainda que os hospitais desenvolvam a sua atividade sempre com o foco primário no cidadão, o que implica uma grande evolução na humanização da forma como é assegurado o percurso do doente no sistema de saúde e nas várias instituições.
A grande evolução que temos de fazer é exatamente neste campo, pois de um modo geral Portugal oferece uma qualidade em termos técnicos ao nível do melhor que qualquer país desenvolvido disponibiliza aos seus cidadãos. Os hospitais em particular, mas os organismos do SNS [Serviço Nacional de Saúde] em geral, tem uma boa margem de progressão na melhoria do acesso e da circulação dos doentes no sistema entre os vários níveis de cuidados (centros de saúde – hospitais – cuidados continuados), fazendo-o de forma a que estes se sintam acolhidos. Isto implica iniciativas de teor geral ao nível do sistema de saúde como um todo, iniciativas de melhoria organizacional em todas as instituições e iniciativas diretamente ligadas aos profissionais, melhorando as suas competências e a sua motivação.
»»» Miguel Paiva é presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga. Com sede em Santa Maria da Feira, o Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, EPE, foi criado na sequência da publicação do Decreto-lei 27/2009, de 27 de janeiro, agrupando o Hospital de São Sebastião, EPE (Santa Maria da Feira), o Hospital Distrital de São João da Madeira e o Hospital São Miguel (Oliveira de Azeméis), com efeitos a partir de um de fevereiro de 2009. Passou a ser responsável pela prestação de cuidados de saúde a uma população que ronda os 340 mil habitantes, residente nos concelhos de Santa Maria da Feira, Arouca, São João da Madeira, Oliveira de Azeméis, Vale de Cambra, Ovar e Castelo de Paiva (neste caso algumas freguesias).
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